sexta-feira, 15 de outubro de 2021

Marternar

Pensando ser a maternidade uma piscina natural de águas calmas e quentinhas, mergulhei. Não demorou para que eu me desse conta de que estava afundando em um mar agitado e profundo, de águas geladas e turvas, com ondas que me empurravam para o fundo e me traziam à superfície, totalmente à deriva. Com o biquíni completamente fora do lugar a que se destinava, me vi exposta a qualquer tipo de olhar e julgamento daqueles que caminhavam tranquilos pela areia fofinha. Mas me surpreendi mesmo, foi com os comentários maldosos de quem estava ali ao meu lado, ainda lutando pra não se afogar. Então, com o passar das marés eu aprendi a, no intervalo de segundos entre uma onda e outra, me deleitar com a brisa quente, o frescor da água e, assim, recarregar minhas energias. Eu afirmo que são esses breves momentos que fazem tudo valer a pena. E talvez sejam eles que tenham feito com que eu saísse da água e, conscientemente, mergulhasse outra vez. Pelo menos, agora de maiô.

Singela

Aonde está a graça, senão nas pequenas coisas? A magia da roda gigante não está na sua imensa estrutura, está nos passos que se dá para entrar no carrinho, no cinto que se fecha, no sorriso ansioso pela subida lenta, nos rangidos e estalos da máquina ganhando vida, no frio na barriga que mistura coragem e medo. A graça está em ter uma companhia ao lado, no toque das mãos, no olhar cúmplice, na paisagem que se revela entre o piscar dos olhos, formada por inúmeros e mínimos detalhes. A graça da vida não está no findar dos dias ou das semanas, ela se esconde no passar dos segundos. E como não poderia deixar de ser, é de graça.

quarta-feira, 13 de outubro de 2021

(DES)FAZ

Ali sentada, com a caneta na mão e as lágrimas teimando em rolar pelo rosto, entendeu finalmente a solidão da vida. As pessoas que iam e vinham pelos encontros do acaso e que deixando um pouco de si levavam também um pouco dela. Restavam-lhe, portanto, apenas pedaços que mal podia reconhecer e que tampouco se encaixavam entre si. Teve vontade de pegar uma borracha e, como quem apaga as linhas escritas a lápis num papel, simplesmente recomeçar sua história. Mas lembrou-se de que não seria o bastante, mesmo apagando o grafite da folha, ainda assim, continuaria vendo as marcas do que um dia lá esteve. Não restavam-lhe portanto opções, a não ser, continuar vivendo. Pegou seus pedaços e se fez forte, para continuar caminhando e carregando tudo que podia ser.