terça-feira, 30 de setembro de 2014

Oi.

Sonhei com você um dia desses. Olha só, já se passaram mais de dez anos e ainda não perdi essa mania de escrever para você mesmo sabendo que você nunca irá ler.

Acho que me acostumei com esse você que é tão meu e que você nem sabe que existe. Tenho certeza que, de alguma forma, algum dia você ainda vai me ver e saber que eu nunca te esqueci só de me olhar.

Sabe, eu te entendo as vezes. Você era bonito, popular, cheio de amigos e namoradas. Eu era apenas uma menina bobinha e feiosa que te passava as respostas nas provas de História e Português.

Eu e você não fazíamos sentido, embora eu sempre tenha gostado do inusitado. Acho que você escolheu o caminho mais fácil de usar meus sentimentos a seu favor. Eu, por outro lado, escolhi o mais difícil: me doar por inteiro em troca de lágrimas.

Mas um dia as lágrimas secam e esse dia até que é bom. Fica um vazio no peito, sabe? Não tem ódio nem amor. Não tem nada. Não tem mais você. Esse dia foi realmente legal e eu até teria te contado, se algum dia a gente tivesse sido amigo. Talvez você até gostasse de saber que eu não te amava mais, embora agora eu esteja mais bonitinha e tal.

Estranho como alguém que parece ser a sua vida, de uma hora pra outra, nem sequer cabe mais na sua vida. Vira um inimigo, vira um desconhecido ou vira, sei lá, nada.

Quando se é adulto, as coisas ficam mais claras. Ou é ou não é. Não dá tempo de criar, fantasiar, sonhar. Tem conta para pagar, né? Tipo, você não é obrigado a ficar cinco horas sentado ao lado da pessoa, sofrendo. Você pode levantar, ir embora e procurar a outra pessoa pra sentar ao seu lado, nem que seja em outra cidade ou país. A gente tem mais possibilidades e dá pra escolher sofrer ou superar.

Tudo é bem mais fácil agora. O tempo foi gentil comigo e espero - eu acho - que tenha sido com você também. Não desejo que você seja feliz porque, você sabe, a vida tirou de mim a ingenuidade e colocou no lugar uma dosezinha de vaidade que me impede de te desejar tudo de bom quando você me fez sofrer um bocado.

Ah, eu te desejo tudo que você merece, tudo que você precisa, tudo que você vá de fato valorizar. Não sei o que foi que aprendi com você. Talvez você tenha apenas me ajudado a perceber que nem tudo que a gente quer, pode ter e que tudo, tudo mesmo, passa. Até a minha esperança de um dia poder me vingar de você, fazendo você se apaixonar por mim e te dando um belo pé na bunda. Teria sido ótimo pra minha auto-estima!

Hoje já não sei se gostaria de te encontrar. Mas nem precisa, porque eu ainda posso te escrever.
Vamos apenas continuar vivendo e sendo nós, sempre longe um do outro. Melhor assim.

Adeus.

Durante todas as aulas era você que eu estudava. Seus gestos, sua pele clara, o cabelo cortado curtinho, os olhos castanhos levemente puxadinhos quando você sorria, a boca carnuda e macia - como eu imaginava que deveria ser - e o perfume levemente adocicado. Por muitas e muitas vezes, deixei de lado a História do mundo para pensar na nossa.

Durante dois anos, você foi a minha matéria favorita, o amigo - e namorado - que eu gostaria de ter, mas que você nunca quis ser. Para você eu me vestia, perfumava e chorava. Para você eu tinha as respostas de todas as provas e por você eu fazia os trabalhos mais difíceis. Te dei meu coração inteiro e você quis apenas meu ombro para chorar suas desilusões baratas, com alguma das minhas amigas. Para mim tudo era simples e lindo. Para você não era nada.

Durante meus sonhos era você que eu via ao meu lado, me olhando e, realmente, me vendo. Sempre que podia, dizia a você o quanto o amava, mesmo que você nunca me ouvisse. E nunca te falei, mas acreditei em você todas as vezes em que me prometeu um beijo descompromissado. Todos os dias você zombava de mim - e do meu amor - e eu sorria. Virei especialista em te querer.

E durante toda a minha vida te levei comigo, em um canto do meu coração, protegido das desilusões desse mundo, esperando que a hora do recreio acabasse e você viesse ocupar seu lugar na minha vida para ser feliz ao meu lado. Mas você não veio. Então mudei de escola, mudei de casa, mudei o cabelo e mudei de amor. Porque um amor não correspondido é igual a uma carta que nunca chega ao seu destino. E hoje sei que enderecei meu amor à pessoa errada.  

Nasci.

Pra brilhar
Na luz do sol ou do luar.
Pra cantar
Na chuva ou no chuveiro.
Pra sentir
Na cama ou no chão.
Pra falar
Com a voz ou com o olhar.
Pra ouvir
Com a alma ou com a pressa.
Pra olhar
Com os olhos ou o coração.
Pra te amar
Nesta vida ou na próxima.


Escrever-se.

Não gosto das páginas em branco, assustadoramente intocadas, ameaçadoramente perfeitas, onde cada traço parece uma agressão, onde cada erro é um grito ecoando em todos os cantos.

Gosto das páginas puídas, marcadas, com vincos e dobras, com marcas do tempo, onde posso escrever sem pensar duas vezes pois, a cada novo erro, apago e continuo minha história.