segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Um certo momento.

Existe um momento, um breve instante, em que tudo se encaixa. Eu e você estamos no lugar certo, com as pessoas certas. Tudo parece estar em seu devido lugar. Por um segundo, ou talvez dois, entendemos do que se trata tudo isso afinal. Nos sentimos parte do todo e podemos vislumbrar a divindade que habita cada molécula desse universo. A vida se mostra gentil e promissora. Nos sentimos plenos e felizes.

Então, da forma mais volátil possível, esse momento se esvai, levando consigo a serenidade que passamos uma vida inteira a procurar. As cores mudam de tom e tudo parece se desencaixar no ritmo descompassado de uma orquestra sem maestro. Por fim, o peito aperta a saudade e esta nos faz lembrar de todos os momentos em que estávamos em outros lugares, com outras pessoas, vivendo outras vidas. E temos a certeza de que isso não pode ser, para nós, a coisa certa. 

terça-feira, 4 de outubro de 2016

Chegada.

Com seu pelo fofinho e olhos ariscos observou tudo ao seu redor. Se aninhou no meu peito e ronronou ao som das batidas do meu coração. Ficamos ali, ele e eu.

Olha.

Você me vê quando eu não estou olhando que é para não enxergarmos o óbvio.

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Estranho.

Fazia tempo que você não aparecia por aqui. Não, acho melhor você não entrar. Prefiro conversar aqui fora, onde os carros passam, os pássaros cantam e o vento sopra. Por favor, deixe minha casa como está. Não há mais espaço para você lá dentro. Eu estava disposta a recebê-lo, mas você não é mais quem dizia ser. Não conheço seu endereço. Não vejo seus amigos. Não sei mais o que se passa em sua mente enquanto você toma seu café olhando pela janela semi-aberta à procura do sol que ainda não nasceu. Portanto, seja breve. Por favor. Mas antes, saiba que esta casa é boa agora. Tranquila e serena com vista para o mar. Tudo se encaixa e não há espaço para que você revire os móveis de ponta cabeça, como da última vez em que esteve aqui. Engraçado...e pensar que justamente desta vez, não fui eu a te expulsar. Com todos os motivos do mundo para fazê-lo, foi você quem saiu. Sozinho. E ainda me pediu para trancar a porta enquanto você caminhava rumo ao desconhecido. Bom, eu deixei você partir, não deixei? Então não faz sentido você voltar. Não precisa. Não mais.

Manifesto.

Amizade não é contar amigos, mas ter amigos com quem contar.

sexta-feira, 24 de junho de 2016

Amor dosado.

Começou num copo. E acabou em outro. Entre eles, alguns anos foram deixados para trás. Gentilmente a bebida lhe apagava as mágoas pedindo em troca o melhor de sua juventude. O álcool entrou em suas veia gole por gole e eu me deixei levar com o coração em pedaços. No começo houve diversão, pensamentos que evaporavam pelo ar, beijos que faziam girar o céu. Toda tarde ganhava uma dose de alegria, de esperança e de amor. Os dias frios passaram a ser quentes e depois vieram as noites, as luzes, as portas de banheiro pichadas e as garrafas vazias espalhadas pelo chão. Achávamos que aquilo era o frescor da juventude. Depois vieram as brigas, os gritos, as lágrimas. E as noites frustrantes de sono irremediável. Deixamos de ser um casal. Deixamos de ser nós. Deixamos aquele veneno destruir nossos sonhos. E enquanto ele aumentou a dose, eu fiz crescer a distância entre nós.

sexta-feira, 27 de maio de 2016

Racional.

Então eu me vi ali, confirmando a única dúvida que nunca tive. Em minhas costas estende-se um passado de lágrimas secas e pensamentos ensurdecedores. Por quê comigo? Por quê agora? Torna-se impossível me reconhecer a esse ponto. Passo de vírgula a um infeliz e deprimente ponto final e pela primeira vez me fogem as palavras. Perdida entre um maremoto de acusações, noto que a palavra que nunca me deu sentindo, agora marca minha alma como uma tatuagem indesejada e irremovível. Me vejo como um poço cheio até a boca e desesperadamente atiro o balde na escuridão. A surpresa me acomete sem que haja tempo de respirar uma única vez quando constato que a água que me refrescava a alma era de dúvidas e constatações. Os sentimentos há muito foram sufocados pelo medo, como uma erva daninha que se espalha e mata tudo aquilo que um dia poderia vir a florescer. Não há saída. Quanto mais eu me questiono, mais imersa estou na escuridão em que me precipitei, vencendo de alguma forma a barreira do não-pensar. Sinto, gota após gota, a água preencher meus pulmões até que encontro, de forma quase inesperada, uma luz que brilha dentro de mim. De início é com uma faísca, mas rapidamente se torna um sol incandescente. Queimando e corroendo minha essência em uma dor insuportável. Tudo agora é luz e também é escuridão. Acordo e já não sou mais a mesma. Eu morri. Mas é estranho porque, de alguma forma, eu também renasci. Desta vez eu sinto e um único sentimento é capaz de dar sentido a todos os outros. Seco uma lágrima e imploro: que esta seja apenas a primeira vez.

Heroína.

Deu vontade de te contar que eu tô bem. Acho que não te interessa saber disso e é um puta egoísmo meu bater na sua porta pra te incomodar por um capricho meu, mas você me conhece. Nunca pensei muito em você porque eu sempre fui prioridade. Eu não tava nem aí pras suas vontades mesmo. Eu fazia o que queria, quando queria e quando você discordava eu virava as costas e ia embora. Eu te traí. E o peso foi tanto que eu não fui capaz de dividi-lo com você, pois sei que você nunca mereceu carregá-lo. Você não mereceu o meu descaso, você não mereceu meus xingamentos inapropriados, as críticas duras, os beijos que troquei com outra pessoa enquanto você me esperava. Eu achava que te ajudava, enquanto me afundava. Éramos dois perdidos e eu teimava em te carregar pelos caminhos que julgava serem os certos. Não eram. Não eram os certos naquele dia, nem naquela hora, nem seriam hoje. Eu precisava de ajuda enquanto tentava te ajudar. E hoje eu sei que você não me pediu isso. Eu é que inventei essa mania de querer salvar você. E eu salvaria. Mas antes eu precisava ser salva. Me desculpe. Adeus.

terça-feira, 24 de maio de 2016

Bifurcação.

Acabou. Não foi nada combinado. Aconteceu, sabe? Nos encontramos numa encruzilhada de destinos e não houve tempo para mudar de rota. Seguimos, cada um por uma estrada, sem nos darmos conta de que ao final poderíamos estar a quilômetros de distância um do outro. Não havia mapa, nem destino certo. Aquele era apenas o começo de nossa jornada. O horizonte convidativo brilhava a nossa frente. Nossos corpos se agitavam diante das incontáveis possibilidades. Alguém nos disse que poderíamos voltar e acreditamos que aquele instante estaria ali, a nossa espera, para sempre. Não prometemos voltar, pois nunca concordamos em partir. Apenas continuamos nossa caminhada passo após passo, dia após dia, ano após ano. E o tempo apagou nossos rastros. Minguaram-se as lembranças. Morreram os sonhos. Perdemo-nos de nós mesmos. 

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Você.


Quando a tristeza me transborda o coração, encontro um poço de lágrimas secas, no qual me atiro sem medo de chegar ao fundo. Longe de mim ser indiferente às mágoas da vida, mas desde cedo soube que a água que me lava a alma é o choro da alegria, da risada que sacode o corpo e põe um sorriso a me rasgar o rosto. Por isso, quando meus olhos ardiam, secos e tristes, você me fez reencontrar a felicidade que se esconde ao final de mais uma gargalhada de tirar o fôlego.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Cadê?

Sua ausência grita uma presença que nunca senti
Não há lembranças, nem histórias, nem marcas
O quase futuro que é passado se faz presente
Espiando pela janela, pairando no ar, rangendo sob o piso
Não há mais espaço para tantos sonhos abandonados
Passeio pelos corredores repletos de doces ilusões
Reviro as caixas de sorrisos e lágrimas intangibilizados
Olho ao redor uma última vez e sei que não vai voltar
Porque nunca aqui esteve.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Busca.

Quem ama não procura defeitos, encontra qualidades.